Gilmar Mendes classificou episódio como “ataque à liberdade de imprensa” e “violação do sigilo da fonte”
O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes criticou duramente, nesta terça-feira (23), a divulgação, pela própria Corte, de uma conversa telefônica entre o jornalista Reinaldo Azevedo e Andrea Neves, irmã do senador afastado Aécio Neves (PSDB-MG). O diálogo foi revelado no contexto da investigação ligada à delação da JBS.
Segundo Gilmar, a legislação que regulamenta interceptações telefônicas proíbe o uso de gravações que não estejam diretamente relacionadas ao objeto da investigação. “O episódio envolvendo o jornalista Reinaldo Azevedo enche-nos de vergonha. É um ataque à liberdade de imprensa e ao direito constitucional de sigilo da fonte”, declarou o ministro.
A conversa, publicada pelo site BuzzFeed, ocorreu em 13 de abril, logo após a divulgação dos conteúdos da delação da Odebrecht, e abordava, entre outros temas, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot. No mesmo dia em que a gravação veio à tona, Azevedo pediu demissão da revista em que trabalhava, afirmando que expor o diálogo era “uma forma de intimidar jornalistas”.
Disputa sobre a responsabilidade pela divulgação
Os áudios faziam parte de um conjunto de gravações liberadas pelo ministro Edson Fachin, relator da Lava Jato no STF, após o fim do sigilo das delações. Em nota, a Procuradoria-Geral da República (PGR) negou ter divulgado o conteúdo, afirmando que “não anexou, não divulgou, não transcreveu e não utilizou” a conversa em qualquer procedimento.
A Polícia Federal (PF) também negou responsabilidade, alegando que o diálogo “não foi lançado em qualquer dos autos circunstanciados” por não ter relação com o caso investigado. A corporação ressaltou que a gravação foi autorizada judicialmente e que apenas o magistrado responsável poderia decidir pela inutilização de áudios irrelevantes para a investigação.
Repercussão no jornalismo
A Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) repudiou o episódio, classificando-o como uma violação ao sigilo da fonte. Em nota, a entidade alertou que a inclusão das transcrições em um processo público coincidiu com críticas de Azevedo à atuação da PGR, levantando suspeitas de retaliação.
“A apuração de um crime não pode servir de pretexto para a violação da lei, nem para o atropelo de direitos fundamentais, como a proteção ao sigilo da fonte, garantido pela Constituição Federal”, afirmou a Abraji.