Morre Preta Gil aos 50 anos, símbolo de resistência e alegria na música brasileira

Cantora, empresária e apresentadora faleceu neste domingo nos EUA, após luta contra o câncer; filha de Gilberto Gil, Preta foi voz ativa contra preconceitos e um ícone da liberdade no Brasil contemporâneo

Preta Gil, cantora, empresária, apresentadora e uma das vozes mais autênticas da música e do ativismo brasileiro, morreu neste domingo (data a confirmar), aos 50 anos, em decorrência de complicações causadas por um câncer. A informação foi confirmada por sua equipe oficial.

Preta estava nos Estados Unidos, onde fazia um tratamento experimental desde que recebeu o diagnóstico da doença em janeiro de 2023. Mãe de Francisco Gil, conhecido como Fran — também músico e integrante do trio Gilsons —, ela deixa um legado que vai muito além da música: um marco de coragem, representatividade e afeto.

Nascida em 8 de agosto de 1974, no Rio de Janeiro, Preta Maria Gadelha Gil Moreira era filha de Gilberto Gil e Sandra Gadelha, sobrinha de Caetano Veloso e afilhada de Gal Costa — uma linhagem que a colocou no coração da Tropicália, mas também diante de expectativas e desafios únicos.

Desde cedo, Preta se posicionou como uma mulher preta, bissexual, fora dos padrões estéticos impostos pela sociedade, enfrentando com altivez o racismo, a gordofobia e a homofobia. “Eu era a Preta no mundinho da Tropicália. Achava que o mundo era igual à minha família. Não era”, declarou certa vez à revista Forbes, numa síntese do abismo entre o acolhimento íntimo e a violência estrutural do mundo externo.

Seu nome — Preta — já foi, desde o início, um ato político. Quando Gil tentou registrá-la, o tabelião se recusou a aceitar o nome alegando ser “inadequado”. A avó materna, Wangry, contestou: “Se fosse Branca, Rosa ou Clara, pode? Acho que o senhor já registrou muitas”. Para vencer a resistência, incluíram o nome católico Maria, e o registro foi feito: Preta Maria.

A infância da artista foi vivida entre o Rio e Salvador, acompanhando os movimentos da vida do pai após a separação dos pais. Preta era a quarta dos sete filhos de Gil, e sempre manteve uma relação de afeto também com sua madrasta, Flora Gil, a quem chamava de “segunda mãe”.

Ao longo da vida, Preta Gil construiu uma carreira marcada por versatilidade, irreverência e entrega. Transitou entre a música, a TV e os negócios, sem jamais se dissociar de sua missão maior: dar visibilidade a corpos, histórias e afetos marginalizados. Com sua voz potente, seu riso franco e sua presença vibrante, ela conquistou espaço onde antes havia silêncio e se tornou inspiração para uma geração inteira.

Mesmo enfrentando uma doença agressiva, seguiu se comunicando com o público, compartilhando momentos de dor e superação com a mesma honestidade que sempre guiou sua trajetória.

A partida de Preta Gil encerra precocemente uma vida que, mesmo curta em anos, foi plena em impacto. Fica o vazio. E a memória de uma mulher que, como ela mesma dizia, não pedia licença para existir — apenas existia. E isso, por si só, já era revolução.