Projeto de inteligência artificial liderado por Elon Musk é o trunfo da Tesla para dominar o futuro da mobilidade autônoma e escalar receitas bilionárias fora do setor automotivo
Por trás da carcaça metálica de um Tesla Model Y circulando em silêncio pelas ruas de Austin, Berlim ou Xangai, existe um fluxo contínuo de dados sendo capturados, processados e transformados em inteligência. A engrenagem invisível por trás desse processo responde por um nome tão enigmático quanto simbólico: Dojo, o supercomputador que Elon Musk vem moldando silenciosamente nos bastidores da Tesla — e que pode agregar US$ 500 bilhões ao valuation da companhia, segundo projeções do Morgan Stanley.
Desenvolvido in-house ao longo dos últimos cinco anos, o Dojo não é apenas mais um data center de alto desempenho: trata-se de uma infraestrutura computacional customizada para treinar sistemas de direção autônoma, aprendendo com as experiências reais de milhões de veículos em circulação. Para os analistas do Morgan Stanley, a tecnologia representa uma “vantagem assimétrica” da Tesla em um mercado global estimado em US$ 10 trilhões, movido por IA, mobilidade inteligente e serviços em nuvem.
“Quanto mais analisamos o Dojo, mais percebemos o potencial de valor subprecificado na ação da Tesla”, escreveram os analistas do banco ao revisar o preço-alvo das ações da empresa de US$ 250 para US$ 400. O papel negociava nesta semana a cerca de US$ 267.
De montadora a plataforma de dados
Para além dos carros elétricos que consolidaram a Tesla como referência em inovação automotiva, o futuro da empresa parece cada vez mais ancorado em software e serviços digitais. A tese: o mesmo movimento que transformou a Amazon na maior empresa de nuvem do planeta com a AWS (Amazon Web Services) pode se repetir com a Tesla, desta vez através da monetização de dados e serviços baseados em inteligência artificial.
O Dojo é o catalisador dessa transformação. O supercomputador foi concebido para resolver o maior desafio da direção autônoma: a coleta e o processamento de dados reais, em escala, e a capacidade de treinar algoritmos com base em situações reais do dia a dia.
Hoje, a frota global da Tesla soma cerca de 5 milhões de veículos conectados — uma rede viva de sensores, câmeras e sistemas que alimentam, continuamente, a base de dados que treina os modelos de IA. A projeção da empresa é atingir a marca de 50 milhões de veículos até o fim da década, o que representará uma expansão exponencial da capacidade de aprendizado e, consequentemente, da acurácia dos sistemas de direção autônoma.
Por que o Dojo é um divisor de águas?
O Dojo começou a ser mencionado por Elon Musk em 2019, mas só em 2021 a Tesla anunciou oficialmente o D1, processador customizado que será o “neurônio” central do supercomputador. O projeto surgiu da constatação de que nem mesmo a Nvidia — principal fornecedora de clusters e GPUs da Tesla — conseguiria suprir a demanda crescente de poder computacional necessário para escalar os testes de IA.
Por isso, o Dojo foi construído com arquitetura própria, voltada exclusivamente para cargas massivas de aprendizado de máquina, com um desempenho superior para lidar com grandes volumes de dados não estruturados vindos dos veículos.
Além da mobilidade, o Dojo abre portas para outras frentes de negócio. De acordo com o Morgan Stanley, o sistema poderá ancorar novas fontes de receita via software como serviço (SaaS), rede de táxis autônomos, sistemas de segurança e análise preditiva — ampliando a relevância da Tesla muito além da indústria automotiva.
Um novo valuation para um novo modelo de negócio
A tese dos analistas é clara: a Tesla está deixando de ser uma montadora para se tornar uma plataforma de inteligência artificial em tempo real — e o Dojo é a espinha dorsal desse reposicionamento estratégico. Com isso, a empresa poderá multiplicar seu fluxo de receita recorrente, explorando modelos de negócio com margens superiores e escalabilidade global.
O valuation potencial de US$ 500 bilhões, atribuído ao Dojo, não é uma cifra aleatória: ele está ancorado na aceleração da adoção de veículos autônomos, na ampliação da base de dados e na monetização dos sistemas embarcados, como o Full Self-Driving (FSD) e as soluções de mobilidade como serviço.
Como no dojo das artes marciais — lugar de prática, disciplina e aperfeiçoamento —, o Dojo da Tesla é onde o carro aprende a dirigir sozinho. E onde a Tesla ensaia o próximo salto: de uma empresa de veículos elétricos para uma das maiores companhias de tecnologia do planeta.