A cada 46 segundos um trabalhador se acidenta e a capital do país vive o maior colapso de fiscalização em meio à omissão do governo federal com a paralisação das nomeações dos aprovados no concurso de Auditores-Fiscais
Às vésperas do Dia Nacional de Prevenção de Acidentes de Trabalho (27 de julho), o cenário no Distrito Federal é alarmante: cresce o número de acidentes em setores como construção civil, indústria e serviços urbanos, enquanto a fiscalização trabalhista continua sucateada. Em 2024, o Brasil já registrou mais de 742 mil acidentes de trabalho e o DF acompanha essa tendência, com
índices preocupantes em canteiros de obras, cozinhas industriais, setores logísticos e até em granjas e carvoarias ilegais.
No DF, cresce o número de acidentes em áreas urbanas e o trabalho escravo e infantil já é realidade. A omissão custa vidas e bilhões em recursos públicos. Segundo dados do Ministério do Trabalho, a maioria dos acidentes ocorre em ambientes urbanos e na construção civil, o setor que lidera os registros no DF, com casos recorrentes de quedas de altura, amputações e mortes por choque elétrico. Os acidentes também se repetem em áreas de limpeza urbana, call centers e indústrias de alimentos e bebidas. Além disso, há zonas rurais no entorno da capital onde trabalhadores são aliciados para atividades em condições degradantes, como mostrou a Operação Resgate IV, que libertou 29 pessoas em situação análoga à escravidão no DF em 2024.
“O Distrito Federal é o coração político do país, mas isso não se reflete na proteção de quem trabalha aqui. Falta Estado, falta fiscalização, falta justiça para quem constrói essa cidade todos os dias”, afirma Pedro Valladão Ferraz, representante da Comissão no DF.
Um trabalhador se acidenta a cada 46 segundos no Brasil
Os dados nacionais refletem a gravidade da situação:
742 mil acidentes notificados em 2024
6.500 aposentadorias por invalidez
41,9 mil auxílios-acidente concedidos
513 pensões por morte
Brasil é o 4º país do mundo em mortes por acidente de trabalho
Mais de 471 mil afastamentos por doenças mentais relacionadas ao trabalho
A conta chega e é alta
A ausência de fiscalização tem alto custo para o Brasil. Apenas em 2023, o país gastou mais de R$ 15 bilhões com benefícios e atendimentos no SUS relacionados a acidentes de trabalho. Um estudo do IPEA, publicado em 2025, estima que a não nomeação de todo o cadastro reserva dos Auditores-Fiscais do Trabalho aprovados no concurso unificado de 2024, represente uma perda de R$ 879 milhões em arrecadação direta por ano. Isso sem contar os ganhos indiretos com redução de acidentes, aumento da formalização e combate a fraudes no FGTS, que sozinho poderia render R$ 239 milhões adicionais. Já a Comissão de Aprovados no Concurso AFT 2024, com base em dados do Ministério do Trabalho, calcula que a convocação dos 1.800 aprovados poderia gerar um retorno de até R$ 1,15 bilhão, enquanto as nomeações custariam R$ 549 milhões por ano – um investimento com retorno fiscal e social imediato.
Apenas 3% das empresas são fiscalizadas
O Brasil possui mais de 5,9 milhões de estabelecimentos econômicos, mas apenas 169 mil foram fiscalizados em 2023 – o que representa apenas 3% do total. Com isso, 97% das empresas funcionam sem qualquer inspeção do Estado, o que amplia o risco de acidentes, adoecimentos e violações.
No Distrito Federal, essa ausência permite a proliferação de vínculos precários, exploração de trabalhadoras domésticas, trabalho infantil e aliciamento de migrantes. Estima-se que mais de 20 mil crianças e adolescentes estejam em situação de trabalho precoce na capital, e o trabalho doméstico informal atinge em cheio mulheres negras e periféricas.
A urgência da nomeação
Mesmo com o número recorde de trabalhadores, o Brasil opera com o menor número de Auditores-Fiscais dos últimos 35 anos. São cerca de 1.800 aprovados prontos para atuar, mas o governo ainda não realizou a convocação. Pior: quase 500 auditores estão prestes a se aposentar, o que agravaria ainda mais o colapso. “Temos uma força-tarefa preparada, diversa e qualificada. São pessoas capacitadas para salvar vidas, garantir arrecadação e combater violações. O que falta é vontade política”, reforça Pedro Ferraz.
RESUMO – DISTRITO FEDERAL
Setores com mais acidentes: Construção civil, indústria alimentícia, serviços urbanos, limpeza pública e obras públicas
Exploração identificada: Trabalho escravo urbano (granjas, carvoarias, serviços domésticos), trabalho infantil e exploração de migrantes
Denúncias de trabalho infantil: 19 apenas no primeiro semestre de 2024
Trabalhadores resgatados em 2024: 29 (condições análogas à escravidão)
Empresas fiscalizadas: Apenas 3% no país; no DF, cobertura ainda menor