Se houve um choque quando começou o isolamento por conta da pandemia, e todos foram obrigados a ficar no ensino remoto, ou, infelizmente, sem ensino, a volta ao que antes era tido como normal também representou um choque. Afinal, foram dois anos de uma rotina completamente abalada, que causou impactos emocionais, de comportamento e pedagógicos.
Após os primeiros meses de retomada das aulas, os sinais de que nada seria como antes se tornaram evidentes. Recebi inúmeros relatos de professores, mães e especialistas contando sobre casos de indisciplina nas escolas, avalanche de notas baixas, problemas de sociabilização, uso ainda mais abusivo do celular durante as aulas e no recreio. Impossível negar, muita coisa mudou. Seria este agora o novo normal? E como lidar com isso?
Escolas e famílias se viram perdidas e, num primeiro momento, atritos aconteceram. Em alguns casos, pais e mães culparam escolas por não estarem preparadas, e, por outro lado, educadores disseram sentir que, em casa, a família não estava envolvida o suficiente. Mas, sem diálogo, ninguém sai do lugar e a solução não aparece. E não adianta tentar resolver os problemas em grupos de WhatsApp. Mais do que nunca, a aproximação entre as famílias e as escolas é absolutamente necessária. Isso vale para educação infantil, fundamental e ensino médio também.
O hábito de falar mal de um professor, ou professora, para as crianças e adolescentes, querendo encontrar um culpado para todos os problemas, não leva a nada e nem ajuda ninguém. Sim, as notas estão piores, sim, a capacidade de concentração está mais baixa, sim, há mais casos de depressão e ansiedade.
Esta semana, em artigo publicado no site Papo de Mãe, o professor Arthur Consiglio Campelo, do Colégio particular Santa Maria, em São Paulo, contou que “depois de dois anos de confinamento com aulas remotas e professores mais tolerantes com atrasos e dificuldade dos alunos, chegou o momento de retornar ao ritmo anterior. Não é uma missão simples, considerando o universo e as particularidades de cada estudante. Por isso, a parceria com as famílias e a conscientização por parte das crianças é peça-chave.”
Segundo ele, ainda é um momento de adaptação, nem todos os estudantes estão conseguindo dedicar o tempo adequado e equilibrado aos pontos da rotina saudável, em especial aos estudos. “A partir do momento que a criança consegue entender seus compromissos, pode tornar o processo muito mais leve e significativo para uma real aprendizagem. O apoio e suporte da família são de suma importância para que os momentos da rotina saudável sejam cumpridos. A criança pode se organizar sozinha, mas a formação de bons hábitos se fortalece se ela estiver com as pessoas que compartilham do mesmo ambiente e objetivo”, escreveu o professor.
A educadora da rede pública, Tatiane Santos, colunista do Papo de Mãe, também notou que, enquanto de um lado há jovens que tiveram dificuldades em se adaptar às aulas remotas e à perda da convivência escolar, de outro existem aqueles que se moldaram muito bem à nova realidade e hoje estão com receio de voltar à rotina presencial e até com dificuldade em socializar novamente.
“O primeiro ponto a ser pensado é que neste momento os sentimentos deverão ser acolhidos, e a maneira como isso será feito será primordial para tudo o que virá depois. Diante desse quadro, também devemos pensar na saúde mental do professor, e em como será esse planejamento para a vida escolar novamente”, ressalta Tatiane.
“O primeiro ponto a ser pensado é que neste momento os sentimentos deverão ser acolhidos, e a maneira como isso será feito será primordial para tudo o que virá depois. Diante desse quadro, também devemos pensar na saúde mental do professor, e em como será esse planejamento para a vida escolar novamente”, ressalta Tatiane.
Educadores já perceberam que é necessário mudar o ritmo das aulas ou até o plano pedagógico que existia antes da pandemia. Há regras novas que talvez tenham que ser criadas. O uso do celular em escolas, em geral, é totalmente liberado.
Mas conversei com uma professora de filosofia de escola particular de São Paulo e ela me contou que tomou uma medida radical: na aula dela, celular não entra. Ou fica do lado de fora, ou fica com ela. Com mais de 30 anos de experiência, a professora simplesmente não conseguia mais dar aulas porque os estudantes só ficavam no celular. Há escolas que já proibiram o uso também na hora do recreio, após notar que ninguém conversava mais, ficava cada um entretido com sua telinha, como se ainda estivesse na aula online, no próprio quarto, em casa.
Sobre esta questão do celular, o problema maior parece estar em uma escola bancar a decisão de proibir completamente o uso – o que pode parecer uma atitude extrema, mas talvez necessária. O aparelho rouba todas as atenções. Quem quer saber de estudar diante de tamanha tentação?
A educação, as famílias, a sociedade, o país passam por transformações. Precisamos saber que futuro queremos para esses adultos de amanhã. Um bom começo pode ser as famílias e as escolas se tornarem aliadas. E, então? O que juntos podemos fazer tendo sempre como foco o melhor para essas crianças e jovens tão afetados pela pandemia?